quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

SERÁ A DEMOCRACIA ACTUAL COMPATÍVEL COM O PODER DAS CLASSES MÉDIAS?




Será a democracia actual compatível com o poder das chamadas classes médias, sem nos levar à  pré banca rota? Em 25 de Junho de 2013, escrevi o artigo, "PERMITIRÁ A NOMENKLATURA, A REFORMA DO ACTUAL SISTEMA POLÍTICO? DUVIDO!" Durante os últimos três anos, todos assistimos através das televisões, jornais, revistas e redes sociais, à veneração e exaltação do papel "incontornável e indispensável" das chamadas classes médias, para a manutenção da democracia, ainda que ninguém queira explicar o que são verdadeiramente essas classes, onde estão e quem as representa.

O último chumbo do Tribunal Constitucional, sobre a convergência das pensões e reformas tem um significado político relevante: os poderes instalados no aparelho de Estado, não aceitam reformas. Toda a oposição saudou a decisão, inclusive o PS (que assinou o Memorando), o qual, se estivesse no Governo teria que tomar medidas idênticas e, como no passado, seria o PSD e o CDS a saudar o chumbo. Todavia, não são apenas algumas das decisões que o TC já tomou, que dificultam as reformas. O Governo tudo tem feito para protelar a extinção de Fundações e Institutos, a reforma e diminuição de organismos públicos, a diminuição das rendas usurárias da banca, da energia, das PPPs e, particularmente, a recuperação dos dinheiros públicos roubados no escândalo do BPN.

Há, certamente, muita tese sobre as razões do impasse político, económico e social e consequentemente constitucional, mas soluções para a crise, continuamos no reino das ilusões. No entanto, a dar crédito aos partidos da oposição, a muitas vozes sonantes no PSD e ao significado das continuas contradições no CDS, o problema não está no sistema, mas no Governo Coelho/Portas. Para estas forças e a generalidade dos comentadores, além da responsabilidade do Governo, culpa principal da situação em que vivemos é da Troika e, principalmente, de Merkel e dos Alemães. Assim sendo, a primeira tese, é a defesa de um governo de salvação nacional, contra a austeridade e pelo crescimento económico, base para reconquistar a independência financeira. Outra tese, muito apadrinhada, é a necessidade de unir a esquerda para formar um governo anti liberal, contra a austeridade. Outra, com cada vez mais seguidores, é sair do Euro e procurar uma convergência política e económica triangular -Portugal, Brasil e Angola.

Subjacente a todas estas teses e outras, difundidas nos média, está sempre a defesa do papel "preponderante e insubstituível" das chamadas classes médias, apesar dos seus principais porta vozes, Pacheco Pereira, Adão e Silva, Daniel de Oliveira, Francisco Louça e Manuela Ferreira Leite, entre outros, face à indiferença do povo aos seus apelos, agora já afirmarem que é o Tribunal Constitucional e a Constituição da República, o último reduto para a defesa do Estado Social, e não o seu poder e força organizativa. O facto de nas últimas eleições autárquicas, apenas terem votado 37% dos eleitores nos actuais partidos, para não descontar os que votaram nos independentes e, particularmente, a saída de mais de 200000 portugueses como emigrantes, não faz reflectir as chamadas classes médias para  mudar de atitude e aceitar fazer as reformas  do sistema, porque o capturaram e porque todos os partidos estão alicerçados e apoiados nessa base social.

Todos nós podemos constatar, que os partidos da oposição e os "contestatários" internos dos partidos que governam, condenam as medidas de austeridade,  porque atingem as classes médias, em particular, o pequeno comércio e serviços, e a "geração mais bem formada de sempre", ainda que alguns procurem passar a ideia que as medidas são iguais para todos os trabalhadores e reformados, com o objectivo de encontrar apoio no mundo do trabalho. Porem, são cada vez mais as vozes a afirmar, que o Estado foi capturado pelo mundo financeiro e as grandes empresas mas, também, aqueles que afirmam, (como Correia de Campos, no Público, do dia 16/12), que a esquerda se deixou capturar pelas corporações dos "médicos, advogados, engenheiros, economistas, professores, farmacêuticos ou funcionários públicos", ou seja, as chamadas classes médias.

Aconteceu que o mundo mudou, profundamente, no último quarto de século. A queda do Muro de Berlim representou, simbolicamente, a derrota do socialismo e a consequente vitória do capitalismo à escala planetária. Como corolário dessa vitória, a Globalização consolidou-se sob a orientação do capital financeiro, com base na ideologia neoliberal. Paralelamente, se os comunistas ficaram sem "farol", os socialistas, sociais democratas e as organizações radicais de esquerda, ficaram sem programa susceptível de continuar a ser os intermediários, entre o capital e o trabalho, porque o socialismo e o comunismo acabou, como ameaça para o capital.

A História tem destes paradoxos. O capital, que tanto apoiou a pequena e média burguesia e seus partidos, para sabotar revoluções e impedir a instauração do socialismo em vários países , agora já não as quer, nem sustenta, a não ser aqueles que aceitem e defendam o liberalismo e a destruição do Estado Social, tal como o conhecemos. As chamadas classes médias  estão desesperadas. ao ver que o seu papel de tampão já não é indispensável. Protestam, ao constatar que empresas públicas e sectores públicos, onde auferiam os seus altos vencimentos, estão a acabar e que, no aparelho do Estado, já não há lugares para todos. Finalmente, revoltam-se perante a concorrência do mercado do trabalho, que aumentou a proletarização que eles tanto desprezam e odeiam,  mas sentem ser a sua única alternativa.

Agora, muitos andam a escrever nas redes sociais, uma citação que, em termos sintéticos, reflecte o seu pânico: "o que temia-mos que os comunistas nos tirassem, tiram agora os liberais!" Quanto ás razões da (in)compatibilidade com a democracia, que são sobretudo ideológicas,  procurarei responder na segunda parte deste artigo.


Sem comentários:

Enviar um comentário