domingo, 23 de outubro de 2011

PROTESTAR OU REFLECTIR? REFLECTIR PARA SABER PROTESTAR!

(Continuação, 4ª parte)




Feito a referência, a alguns factos que contribuíram para a manutenção das desigualdades dentro do mundo do trabalho e entre este e o capital, será possível retirar uma ilação: é preciso protestar e contestar as medidas de austeridade! No entanto, é indispensável, identificar os objectivos da contestação. Já afirmei e escrevi várias vezes, que o acordo com a Troika, é para cumprir. A dívida pública e privada, fruto da nossa irresponsabilidade colectiva, tem que ser paga, consequentemente, terá que haver medidas de austeridade.




A contestação e as eventuais manifestações, devem pois exigir uma melhor repartição dos sacrifícios. O capital, os lucros, as grandes fortunas mobiliários e imobiliárias, tem que ser taxadas a sério. As reformas duplicadas ou triplicadas, derivadas de funções públicas em qualquer organismo do Estado, terão que acabar. As reformas douradas, escandalosas,algumas das quais vinte vezes superiores ao salário mínimo nacional, terão que ter um tecto máximo. As subvenções atribuídas aos políticos que tem reformas do Estado, ou ainda activos à frente de grandes grupos , com vencimentos elevadíssimos, devem ser anuladas. Não venham, agora, invocar direitos adquiridos, quando a generalidade dos que trabalham e de muitos reformados, assistem à suspensão dos acordos e contratos de trabalho isto é, de direitos adquiridos.




Retomando o tema, das razões que nos colocaram na situação de banca rota, a questão dos fundos, vindos da União Europeia, constitui certamente um dos maiores escândalos no pós 25 de Abril. Recebemos subsídios para a agricultura, pescas, indústria e formação profissional, entre muitas outra áreas, para modernizar e reorganizar o país. Todavia, quando a globalização se começou a generalizar e aumentou a concorrência, o país acordou e constatou que não tinha capacidade de concorrer, porquê? Porque, os fundos não foram aplicados para cumprir os objectivos pré determinados mas, antes, para criar uma infinita organização de serviços de formação, reorganização e modernização com milhares de "quadros", remunerados com vencimentos escandalosos, praticando enormes desvios de dinheiro para os mais diversos fins e outros, para benefício pessoal.




Mas poderá dizer-se, que não houve nenhum aproveitamento de todas as ajudas vindas da então CEE? Claro que não! Portugal modernizou-se em muitos aspectos. Foram construídas muitas infra estruturas necessárias, estradas, hospitais, escolas, universidades,abastecimento de águas e saneamento, etc. No entanto, a megalomania típica dos portugueses contribuiu, decisivamente, para maior desperdício dos fundos europeus, como por exemplo: Centro Cultural de Belém e Casa da Música do Porto, quase sem actividade cultural;sede da Caixa Geral de Depósitos, para ostentação do poder económico; estádios de futebol para o euro, agora vazios e alguns já à venda; auto estradas por todo o lado,sem comércio e movimento que as justifique e com encargos que nos arrasam as finanças públicas; etc, etc.




Estes factos e muitos outros que poderia enumerar, são apenas da responsabilidade dos políticos, como agora nos querem fazer acreditar? Não! A responsabilidade é de todos nós, os que fizeram, e os que permitiram fazer, ainda que apenas por omissão de cidadania. Não foram apenas os empresários e patrões que desviaram os fundos. Na formação profissional, houve milhares de trabalhadores que receberam subsídios de formação e não participaram nas acções, outros aceitaram os subsídios e continuaram a trabalhar nas empresas sem receber formação, em ambos os casos, apenas assinando os recibos com a conivência dos patrões e formadores ou empresas de formação.




Como sabemos, foram muitos os casos de desvios de fundos e de corrupção pelos mesmos, que acabaram nos tribunais. Todavia, como vai sendo usual no nosso país... os culpados não são condenados por falta de provas e, outros casos, acabam por prescrever numa teia de cumplicidades que, a não ser combatida e erradicada, pode acabar com o regime democrático. Concluindo, podemos e devemos condenar as medidas de austeridade, o actual governo e até o regime democrático, como já muitos defendem, sem estar disponível para alterar-mos os nossos comportamentos e apenas exigir tudo aos outros? Continuamos a reflectir...








sábado, 22 de outubro de 2011

PROTESTAR OU REFLECTIR? REFLECTIR PARA SABER PROTESTAR!

(Continuação)



Feito o enquadramento político, ideológico e económico internacional, nos dois artigos anteriores, cumpre agora analisar, se devemos reflectir para contestar as medidas do actual Governo, ou se, seguindo a generalidade das pessoas que vão tomando posição, devemos apenas contestar. Tendo em consideração, tudo o que se diz e escreve nos média, mas também o que se vai escrevendo nos blogues e nos comentários aos artigos, ás notícias, ou às opiniões expressas nos blogues, direi que, quase tudo já foi dito mas, não sistematizado.


Penso, contudo, que continua sem se discutir e sem tirar conclusões sobre três problemas importantes, não só decisivos para compreender a situação de dependência em que nos encontramos, como também, para se entender como chegamos à banca rota: A desigualdade inaceitável da sociedade portuguesa; A de lapidação dos fundos que vieram da União Europeia; O facto de vivermos à décadas acima do que produzimos, ou seja, termos vivido como "ricos", quando apenas trabalhamos para ter vida de "pobres".


Vejamos a questão da desigualdade. Quantos relatórios de organismos internacionais foram publicados, referindo a desigualdade na sociedade portuguesa, não só entre o capital e o trabalho mas, também, entre os que exercem funções subordinadas? Quantos documentos e artigos estrangeiros, denunciaram que os gestores, os professores, os médicos e outras profissões mais ou menos liberais, ganhavam acima da média europeia, de que o exemplo mais paradigmático, era o vencimento do Governador do Banco de Portugal ser superior ao do Presidente da Reserva Federal Americana?


Entretanto, como se ia "combatendo" as desigualdades? Portugal chegou a parecer um autentico estaleiro com obras por todo o lado. Fundos para reorganização e modernização das empresas, eram às centenas de milhões de euros. O Fundo Social Europeu, comparticipou com com valores astronómicos para a formação profissional. Contudo, a generalidade dos trabalhadores e dos operários que não pertenciam à "elite" dos funcionários públicos ou das empresas e outras entidades públicas, continuavam sem recuperar dos cortes salariais dos períodos em que o FMI "dirigia" Portugal, porque?


Porque, quando havia muita necessidade de mão de obra e, como consequência, os trabalhadores poderiam exigir maiores salários e condições de trabalho, os empresários (para não lhe chamar apenas patrões), com a conivência de vários governos, "inundaram" o mercado com centenas de milhar de emigrantes, uns legais e outros clandestinos, o que impedia os aumentos de salário para muitos e a desvalorização para muitos outros dos operários e trabalhadores portugueses!


Simultaniamente, as Ordens dos Médicos, Engenheiros, Professores, Arquitectos e outras profissões qualificadas, a chamada "classe média" tudo fizeram para impedir a entrada de emigrantes nessas áreas, apesar da falta que faziam e muitos, inclusive, se encontrarem a trabalhar nas obras. Esta situação, entre muitas outras, ainda agudizou mais a desigualdade entre os que executavam os trabalhos e os que "mandavam". E digo que mandavam, porque quem dirigia de facto eram muitos engenheiros e técnicos estrangeiros, como o que morreu na ponte Vasco da Gama, enquanto os eng. portugueses assistiam engravatados!


Falta contudo referir ainda um aspecto importante, a responsabilidade dos sindicatos. Enquanto a situação do mundo de trabalho se degradava nas fábricas e na construção civil, na função pública e no Sector Empresarial do Estado, começou a generalizar-se duas categorias de trabalhadores: os que tinham contrato, acordo ou outro vínculo de trabalho, e os que não tinham qualquer garantia de trabalho. Os sindicatos, para manter ou até aumentar vencimentos e outras regalias dos trabalhados antigos, nada fizeram para impedir que as empresas contratassem trabalhadores a prazo, sem qualquer regalia e com vencimentos muito inferiores, muitas vezes menos de metade.

Como consequência, em poucos anos, nalgumas empresas, eram mais os trabalhadores com conrato a prazo, ou cedidos por empresas de trabalho temporário, do que os funcionários efectivos. Agora...tudo se conjuga...para a suspensão dos acordos, contratos e direitos para todos!


(Continua)

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

PROTESTAR OU REFLECTIR? REFLECTIR PARA SABER PROTESTAR!

(continuação)






A situação de dependência da UE, do BCE e do FMI, em que Portugal se encontra, deriva de vários factos históricos e acontecimentos recentes, externos e internos. Como hoje já é reconhecido, por quase todos os analistas e comentadores portugueses, pelo Presidente da República e pelos partidos de direita, que estamos perante uma crise sistémica do Euro e não apenas uma situação de crise interna, não me alongarei sobre os factos externos. Todavia, não posso deixar de salientar, que se continua a omitir a principal razão da crise da Europa, em particular, e do Ocidente, em geral.


O colapso da União Soviética, a queda do "Muro de Berlim", a transformação política da China e a consequente desintegração e extinção da generalidade dos partidos comunistas, é a consequência da vitória do Capitalismo à escala mundial. Como corolário desta vitória, a Globalização económica ganha amplitude, a desregulamentação generaliza-se e o capital financeiro toma conta do mundo, através da política neoliberal.


Os factos referidos, conjugando-se objectivamente, permitiram que todas as multinacionais e grandes empresas da Europa e da América, desviassem os seus grandes investimentos, através da deslocalização das empresas, para o Leste e, em seguida, para a Ásia, China e Índia entre outros. Sem qualquer receio de perda dos seus investimentos, pois no imediato deixou de haver qualquer alternativa ao capital no mundo inteiro, o mundo financeiro conquista dois grandes objectivos: lucros fabulosos nas regiões onde a mão de obra era comparativamente mais barata e, através da movimentação de milhões de trabalhadores, desvalorizou progressivamente os salários dos operários da Europa e da América.


A Europa, na qual nós já estávamos integrados, que até então fabricava produtos para os seus povos e exportava para todo o mundo, assistia agora ao fecho das suas fábricas, à falta de trabalho para as novas gerações, agravando-se ano após ano, enquanto ao mesmo tempo os trabalhadores mais velhos se reformavam ou eram despedidos. Actualmente, dezenas de milhões de pessoas na Europa não trabalham, não produzem riqueza e muitos vivem das reformas ou subsídios. Entretanto, os vários Estados estão cada vez mais endividados e, para evitar a banca rota, vão destruindo o Estado Social, criado ao longo dos últimos cinquenta anos. Como consequência, aumenta o número de pobres e excluídos, os rendimentos dos que trabalham são cada vez menores, ao mesmo tempo em que os ricos estão cada vez mais ricos e tornaram-se nos únicos decisores sobre o futuro das sociedades.











PROTESTAR OU REFLECTIR? REFLECTIR PARA SABER PROTESTAR!


O corte dos subsídios de férias e do Natal, o aumento do IVA para vários produtos e serviços, a alteração dos horários de trabalho, a diminuição da remuneração do trabalho extra ordinário, o aumento do IMI e outros impostos e taxas, que significam! Início da destruição do Estado Social!


Esta minha conclusão, significa, que se o PEC IV tivesse sido aprovado e o Governo do PS, liderado por Sócrates, continua-se, não seriam tomadas medidas de austeridade? Não! Como todos sabemos, o memorando da Troika, foi negociado e aprovado pelo Governo do PS, como consequência, teria que executar as medidas necessárias para a consolidação orçamental.


O que esteve subjacente ao chumbo do PEC IV e hoje é claro e evidente, são duas agendas políticas, duas formas de superar a crise económica e financeira, a luta ideológica entre uma visão política de esquerda e reformadora do PS e uma visão de direita, PSD/CDS,liberal na forma e conservadora na sua essência Uma luta, entre os defensores do Estado Social, conscientes e dispostos a fazer as reformas necessárias para o manter, e uma direita, ansiosa por aproveitar as medidas indispensáveis do acordo e as reformas por eles desejadas, para destruir e Estado Social.


As decisões que o Governo do PSD/CDS vem tomando, constituem uma vingança há muito desejada e agora possível, com um Governo, uma Assembleia e um Presidente da direita, o qual, com a conivência do PCP e do BE, tudo fez para derrubar o Governo de Sócrates! Perante estes factos, como compreender a atitude das vítimas da austeridade que, agora, aceitam e querem manifestar-se sob a liderança dos que ajudaram a direita a conquistar o poder? É por essas e outras atitudes que, antes de protestar, devemos reflectir sobre quais foram os factos e motivações que nos conduziram à situação de crise actual, ou seja, porque voltamos a ser um "protetorado".


(continua)