quarta-feira, 25 de abril de 2012

O MEU 25 DE ABRIL!

Trinta e oito anos após o 25 de Abril, depois de muitas e variadas versões e até contradições, acerca os motivos do Golpe Militar e sobre quem foram os principais protagonistas, permita-me que, pela primeira vez, escreva na primeira pessoa, fale sobre a minha participação política, antes e depois, da gloriosa arrancada dos Capitães de Abril.

Antes disso, como cidadão e activista político, há mais de cinquenta anos, quero expressar o mais sincero agradecimento, a todos os militares que realizaram o Golpe de Estado, contra o regime fascista e que, contribuíram, para que o 25 de Abril se transforma-se numa revolução democrática. Na pessoa de Otelo Saraiva de Carvalho, organizador e coordenador das operações, e na do saudoso Melo Antunes, ideólogo do Programa do Movimento das Forças Armadas, deixo um grande abraço de solidariedade, admiração e um muito sentido OBRIGADO, extensível a todos os que com eles colaboraram!

O meu 25 de Abril, começou às 7,30 horas, em Paris. Preparava-me para começar a trabalhar, numa das quatro grandes subestações de electricidade que alimentavam o Metro de Paris, Barbés Rochechouart, quando, inesperadamente, entra nas instalações o meu camarada de trabalho e grande amigo africano, da Guiné Conacry, a gritar: Béxiga! Béxiga! Golpe de Estado em Portugal!

Apesar de meio sonâmbulo, pois tinha passado quase toda a noite em mais uma das intermináveis discussões por causa da cisão do PCP-ml e da necessidade de unir os marxistas leninistas, reagi saltando, gritando e abraçando todos quantos estavam a trabalhar comigo! Ainda incrédulo, saí de imediato para poder confirmar, através da rádio e vários contactos telefónicos, se era ou não verdade e quais eram as motivações dos autores do golpe. Após receber várias informações partidárias e de amigos, regressei ao local de trabalho para afirmar: hoje já não trabalho e, se, como espero e desejo, o golpe tenha derrubado o regime fascista, não trabalharei mais em França e regressarei a Portugal logo que me seja possível!

Perante esta minha tomada de posição, todos os meus camaradas de trabalho apoiaram, pois sabiam ser essa a minha intenção desde sempre e sabiam que eu era um Homem de luta e de palavra. Porém, ao mesmo tempo, o responsável pela coordenação dos trabalhos, chamou-me a atenção, que eu já tinha assumido a responsabilidade de ir coordenar os trabalhos, na subestação da Torre Eiffel. Nada me demoveu, e parti para as portas da Embaixada de Portugal, para participar nas manifestações com outros exilados, jovens desertores do serviço militar e alguns, poucos, trabalhadores imigrados!

 Só regressei ao local de trabalho passado dias, para me despedir dos meus queridos camaradas,depois de ter pedido a demissão e a compreensão, por não poder assumir os compromissos anteriores.Agradeci ao dirigente da Alsthom, Pierre Pichet,meu grande amigo desde que dirigiu a empresa em Portugal e onde eu tinha trabalhado cinco anos, antes de sair para fazer o serviço militar, que me facilitou a resolução de todos os problemas, assim como, anteriormente, já me tinha dado trabalho, logo no primeiro dia em que me consegui legalizar.

Dia de alegria e felicidade indescritível e inesquecível. Tinha chegado o dia em que podia regressar a Portugal em Liberdade! Terminava a luta, "Por um Portugal que não precisemos de imigrar", que entre outras coisas, tinha levado à realização dos jogos Florais, em Paris, em que intervieram quase todos os cantores revolucionários e me obrigou a trabalhar 36 horas seguidas para ultimar a instalação eléctrica. Era o tempo de partir e participar na consolidação da Liberdade, na construção  da Democracia e do Desenvolvimento, em Portugal.

Seguiram-se incontáveis contactos, reuniões e discussões, tendo em conta as responsabilidades de direcção que tinha, a nível partidário sindical e associativo. Ao mesmo tempo preparava a regularização da situação da minha companheira de então e da minha querida filha, assim como da casa onde habitávamos e ainda da despedida de amigos da minha região, que por nunca se terem interessado pela política, não compreendia a minha decisão e insistiam que eu ficasse, tendo em conta a minhas excelentes condição de trabalho e remuneração.

No início de Maio, no comboio dos sonhos,regresso com a família, a Portugal. Deixo para traz o país que adoro, que me acolheu, quando fugi do fascismo para não ser preso, como foram outros camaradas meus, entre os quais o Fernando Rosas. Deixo, agradecido, o Povo que me permitiu a realização e o respeito profissional, que me deu a possibilidade de aprender a viver em Liberdade. Deixo a França amiga e acolhedora de todos os exilados de Portugal, Espanha, Grécia e de outros países europeus, bem como, exilados de todo o Mundo.

Abandono a Cidade das Luzes, das grandes universidades, bibliotecas e livrarias, mas também das grandes fábricas, que alimentavam o intelecto de tantos revolucionários e democratas, que lutavam pelas transformações, ou apenas, reformas dos seus países. A cidade das manifestações contínuas, dos grandes comícios e debates pela Democracia nos países fascistas, pela Liberdade dos Povos colonizados, como foi o caso do comício aquando a declaração de independência da Guiné e Cabo Verde e, principalmente, contra a guerra no Vietname!

Terminava assim, dois anos e meio de exílio onde, para além de alguns fins de tarde ou fins de semana em que dedicava à minha querida filha, levando-a a passear nos jardins, dediquei todo o meu tempo ao estudo e leitura, de tudo o que era livros e imprensa comunista e revolucionária, que me tinha deixado deslumbrado quando entrei na Masperó.Paralelamente, desenvolvi intensa actividade política, cultural e associativa, no sentido de mobilizar ,alguns trabalhadores imigrantes,para a actividade política. Em suma, abandonei Paris, sem ter tido tempo para dedicar ao conhecimento da rua riqueza cultural e dos seus extraordinários Monumentos!

Deixei para traz uma carreira profissional consolidada, de operário altamente qualificado, onde trabalhei menos de dois anos porque, desde que cheguei, passei cerca de oito meses em quatro empresas, para tentar legalizar-me. Foram meses muito difíceis em que esteve iminente a minha expulsão, por falta de documentos, que normalmente as pequenas empresas prometiam, mas não davam, para obrigar os clandestinos a todo o tipo de trabalho mal remunerado. Fiz todos os trabalhos que me apareceram, inclusive, andar de mobilex com aspirador às costas, pelas ruas de Paris, para limpar casas particulares e estabelecimentos comerciais!

No 25 DE ABRIL, de 1974, vivi como cidadão, o dia mais feliz da minha vida, na cidade mais bela do Mundo. Decidi abandonar a Cidade das Luzes, para regressar a Portugal, entretanto iluminado pela Liberdade, oferecida pelos Capitães de Abril. Quando cheguei, com cerca de 100 k.
de livros, revistas, jornais e documentos, para me ajudar a reiniciara actividade política e sindical, que tinha deixado em 1971, agora com outros camaradas e com a participação do Povo. Creio não ter tido qualquer descanso durante mais de um ano, todavia, essa aventura maravilhosa...fica para outro dia. VIVA O 25 DE ABRIL E OS SEUS AUTORES!

Sem comentários:

Enviar um comentário